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Para não dizer que não falei de Pierrôs e Colombinas

18/02/2012
 

Escrito por Franklin Douglas (*)

É de responsabilidade da commedia dell´arte (comédia de arte, teatro popular improvisado, surgido na Itália do século XV, que se desenvolveu e popularizou na França até o século XVIII) a criação das personagens que há anos circulam pelas ruas e bailes carnavalescos: Pierrô, Colombina e Arlequim.
O estilo teatral commedia dell´arte surgiu em oposição à comédia erudita, à época um teatro literário e em latim, idioma já inacessível ao povo de então. Através do trio amoroso (Pierrô que amava Colombina que amava Arlequim), o teatro de rua produzia um entretenimento popular que seduzia amplamente a atenção do povo pela vinculação às brincadeiras de carnaval e pelas histórias críticas e satirizadas dos poderosos da época.
Para além do trio mais famoso, havia também o Pantaleão, caricatura dos patrões da antiga elite italiana, avarento, tirano e desajeitado; o Doutor, intelectual pomposo; o Capitão Spaventa, oficial covarde, mas metido a valente; o casal de filhos dos patrões (Isabella e Orácio); e serviçais. Todos fontes de relaxo do teatro de rua e dos populares.
Datadas de 600 anos antes de Cristo, as festas pagãs gregas (de adoração a vários deuses) foram incorporadas no ano de 590 depois de Cristo pela Igreja Católica. Ela tentou unificar os vários festejos pagãos numa só época, o tempo do “carnis valles” (termo que originará a expressão “carnem levare”, posteriormente modificada para “carne, vale” (adeus, carne!), criando, entre os séculos XI e XII, a palavra carnaval), sete dias permitidos aos prazeres da carne antes do início da Quaresma, período de 40 dias no calendário católico consagrado à penitência e ao jejum anterior à Semana Santa. Em Portugal, também denominadosEntrudo os quatro dias anteriores à Quarta-feira de Cinzas – chamados “gordos” em oposição aos dias magros do jejum da Quaresma.
Por anos, mesmo sob permissão da Igreja (foi o Papa Paulo II (1417-1464) quem instituiu o baile de máscaras), o tempo do “carnis valles” ficou desprovido dos atos pecaminosos das festas da Antiguidade, onde se comia, bebia, participava de alegres festas e se buscava incessantes prazeres. Tempo em que negócios eram suspensos, escravos libertos temporariamente e as restrições morais eram relaxadas. Onde, também, um rei era eleito de brincadeira e comandava o cortejo pelas ruas. O povo retomou o festejo nos moldes greco-romanos através da Paris de 1830-1850, de onde o carnaval tomou o mundo em sua versão moderna: festa popular, de rua, a gosto do povo e suas fantasias.
Daí a imediata proliferação de Pierrôs e Colombinas. Pierrô, sentimental e ingênuo, vestido em roupas largas, metade preta, metade branca e com uma lágrima no rosto; Colombina, criada da filha do patrão, refinada, esperta, em seu vestido que lhe dá forma sedutora; Arlequim, rival de Pierrô pelo amor de Colombina, usava traje feito a partir de retalhos triangulares de várias cores, representando o palhaço, o farsante, o cômico.
As origens europeias constituem as raízes do carnaval brasileiro, via influência dos colonizadores portugueses, que trazem seu Entrudo ao Brasil por volta do século XVII. Foi no Brasil que o carnaval melhor se reinventou.
O entrudo português de brincadeiras violentas deu lugar às brincadeiras mais leves. O primeiro baile de máscaras, em 1840, reuniu a elite nos salões, enquanto o povo festejava nas ruas, consagrando, em 1846, o “Zé Pereira”, apelido do português José Nogueira de Azevedo Paredes, que introduziu o bumbo na folia momesca.
A partir dele, tem-se a mistura anárquica do toque das zabumbas e tambores pelas ruas do carnaval carioca e seus blocos de sujos, cordões de negros, mulatos e brancos humildes (1855), ranchos (1873), corsos/caminhões ou carros sem capota (1907) de onde os brincantes lançavam seus confetes espanhóis e serpetinas francesas (ambos trazidos ao país em 1882), e, posteriormente, em 1899, dando asas à primeira marchinha do carnaval brasileiro: Ó abre alas, de Chiquinha Gonzaga.
Nos anos 1920/30 surgem as escolas de samba, os blocos; em seguida, da dupla elétrica na forbica sob o frevo pernambucano de Dodô e Osmar, em 1950, vêm os trios elétricos da Bahia e a industrialização crescente do carnaval de passarela do Rio e de São Paulo, dos anos 1960 a 1990.
Como se vê nesse percurso histórico, desde os tempos antigos o carnaval é do povo, não dos figurões. A tradição, portanto, é a da sátira à elite dominante. Da commedia dell´arteda Itália do século XV ao bloco Os Ali Babás e a banda Bandida do Maranhão do início do século XXI. E não adianta derramar milhões na Beija-Flor e no esquema Marafolia decadente: mesmo sem dinheiro, o que diverte o carnaval do maranhense são as brincadeiras e os blocos nas ruas dos bairros de São Luís e no interior do Maranhão.
O “Zé Pereira” do maranhense está nas praças, becos e ruas das cidades, e não no sambódromo carioca, palácio e salões da oligarquia!
Em tempo (triste): Solidarizo-me com Deane e Flávio Dino na dor da perda prematura do filho Marcelo, aos 13 anos. Dessa tragédia familiar, uma lição para todos nós: não há incluídos e excluídos nesse nefasto sistema social que mercantiliza a formação de médicos e a rede de saúde. Estamos todos no mesmo barco. Como disse Flávio ao desabafar, ante a falta de um aparelho na UTI que reanimasse seu filho quando ele parou de respirar e a inexistência de um equipamento para fazer a necrópsia do corpo no IML, “quando há esquema político na área da Saúde não se resolve o problema e as pessoas morrem”. Pais e filhos, estamos à mercê dessa lamentável realidade, em Brasília ou, sobretudo, aqui no Maranhão…
Em tempo (feliz): Enfim, a Ficha Limpa se estabelece pra valer! Um milhão e seiscentas mil assinaturas, muita mobilização social, articulação do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), aprovação no Congresso Nacional, sanção presidencial e constitucionalidade reconhecida pela maioria do STF. Políticos ficha-suja, tremei-vos! Viva a iniciativa popular do povo brasileiro!!

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(*) Franklin Douglas – 
jornalista e professor, escreve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente.

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